Ao Redor do Meu Jardim
Caminhar é um óptimo exercício para o físico e para o espírito. Este foi um passeio que jamais esquecerei.
Há uma colina muito arborizada próximo da minha casa. Sempre que me quero lembrar de como sou abençoada, eu vou por essa colina.
No alto, há uma linda e velha casa de pedra que eu admiro desde que mudei para cá há mais de 10 anos. Eu converso com o velho casal que está sempre a trabalhar no seu terreno todas as vezes que passo. Devem trabalhar muito no jardim porque ele nos oferece uma bela paisagem. Entre as flores abundantes e as matas posso ver estátuas gregas e banheiras para os pássaros.
Mas este ano, notei uma mudança.
O mato cresceu além do normal e as flores não estavam tão bem cuidadas.
- Como estão vocês, meus amigos? Perguntei quando passava em frente à sua varanda. - Estamos tão bem quanto se pode esperar.
Eles estavam sentados na varanda. Ele usava um quente casaco de lã, aberto na frente, deixando ver ainda um colete azul de malha. Apesar do facto de nunca saírem, ele usava uma gravata, como sempre.
Ela estava sentada numa cadeira de balanço, embrulhada da cabeça aos pés num cobertor. Por baixo, dava para perceber, ela usava umas quentes calças de lã. Em contraste eu usava uma camisola leve e uns calções. Naquela idade, qualquer brisa mais fria requer uma roupa mais quente.
- Vocês estão prontos para o Inverno? Perguntei. - Com o passar dos anos, nós aprendemos a antecipar os frios dias de Inverno. A nossa lareira e a nossa varanda são um bom refúgio e é um óptimo lugar para uma chávena de chá e um bom livro. Você ainda está a escrever aquele livro? Perguntou-me ele. - Não, já foi publicado, mas em breve escreverei histórias ouvidas ao longo do caminho. Prometo trazer um para vocês, disse eu. - Espero estarmos aqui para lê-lo. Ele disse. - Estão a pensar mudar daqui? Perguntei. - Não minha amiga. Como esta estação em que estamos agora, nós estamos no Outono de nossas vidas. O nosso tempo junto agora é medido em estações. Rezo para que possamos sobreviver ao Inverno.
Então, virando-se para sua esposa, ele disse, - O meu amor não está muito bem. O meu coração dói por ela. Eu não estou certo de que vamos... E, começou a chorar.
Eu, nervosamente, esfreguei os braços, como se tivesse frio, sem saber o que dizer.
- Eu sempre gostei da aparência de nosso terreno durante o Outono. Acho que devo estar grato por Deus nos permitir, pelo menos mais uma vez, ter esta vista espectacular. Mas enquanto as folhas caem, eu vejo minha esposa começar a murchar.
- Não sei se já lhes falei isto. Mas o vosso trabalho, este presente de vocês que traz vida ao mundo na forma de flores e árvores, levantou o meu ânimo muitas vezes. Durante muitos anos passei por aqui e sempre parei o tempo suficiente para renovar as minhas forças. Deve dar-lhes grande satisfação ver o fruto do vosso trabalho. Disse-lhe eu. - Sim, com certeza. Excepto durante este último ano. Pudemos fazer pouco por causa da saúde deficiente de minha esposa. Eu sempre soube que seria capaz de reconhecer quando o nosso tempo junto estivesse a terminar. Disse ele.
Então, saindo cuidadosamente da varanda, ele apontou o caminho pelo jardim que começava ao lado e envolvia a casa inteira. - Essa grade coberta de rosas foi desenhada para parecer os portões de Céu. Jurei nunca andar sozinho por este caminho. Ela será sempre o meu apoio.
Olhei, admirando todo a beleza do caminho, e perguntei, - Vocês têm passeado por ele ultimamente? - Não. E é por isso que está em tão mau estado. Mas é nosso sonho ver a Primavera juntos mais uma vez e dar mais um longo passeio...
Então, de repente, tive uma ideia. Uma daquelas ideias, movidas pelo coração e que, só quem tem fé, sabe de onde vêm. - Vocês têm uma cadeira de rodas? Perguntei. - Sim. Na varanda de trás. Nós não a usamos. Eu não a consigo manobrar. O caminho não é pavimentado. - Sim, mas eu posso. Diga à sua esposa que vamos passear. Eu vou buscar a cadeira.
Nós três passeámos pelos Portões de Céu... Ele ficou ao lado da cadeira segurando a mão da esposa. Passeámos juntos. Talvez uma última vez.
- Esqueçam-se de que estou aqui. Quero que seja só vosso, este momento juntos. Vou ficar em silêncio. Pensem em mim apenas como se das mãos de Deus se tratasse e Ele estivesse aqui a apoiá-los.Valeu a pena!
De facto senti-me invisível. Fui testemunha de um momento notável quando ele começou a cantar suavemente para ela. Num certo momento, ele parou, ajoelhou-se à frente dela, acariciou seu rosto, ela inclinou-se e beijaram-se.
Eu não tenho ideia de quanto tempo levou. Gostaria que tivesse sido eterno. Um dia será.
- Obrigado. Você não tem ideia do que fez por nós. Disse ele. - Vocês é que não têm nenhuma ideia do que fizeram por mim, respondi emocionada. Com a vossa permissão, esta é uma história para meu próximo livro.
Então sua esposa tocou na minha mão e sorriu. De sob seu cobertor ela tirou uma pequena rosa que tinha arrancado pelo caminho. Gesticulou para que eu a pegasse. Mas eu peguei na sua mão colocando-a junto à dele e disse, – Deve ser a última rosa deste ano. Uma flor para lembrar a ambos que a Primavera espera por vocês.
Por todos os dias restantes da minha vida, serei grata por aquele passeio. Eu caminhei pelo Portão do Céu para mais um passeio ao redor do jardim.
Dedicado ao meu querido filho Rui, para que, de novo nesta viagem ele, visitante assíduo do meu blog, se sinta "uma vez mais em casa.